Era uma vez...
Era uma vez...

Entre olhares

Os olhares chocaram. A temperatura corporal subiu. As emoções modificaram as suas posturas.

Sempre que entrava no metro procurava-a. Ela mantinha o olhar atento à porta e assim que ele a encontrava fugia para o escuro do túnel.

Ele procurava sentar-se bem perto dela, se bem que a ansiedade abanava-lhe as pernas. Apenas os sentimentos de vaidade o seguravam de pé. A impotência une-se aos outros quando se senta uns lugares à sua frente.

Ela esforça-se por não dar pelo seu interesse. O pescoço dobra-se ao peso da vergonha pela atracção por um “miúdo” – como lhe chama nas conversas com as amigas – e as pupilas dilatam ao toque da vaidade pelos olhares indiscretos que trocam.

Os olhos brilhantes, como a água cristalina da baía, deixam-na como uma garça assustada pelo aproximar barulhento de umas pernas mutantes.

Os restantes viajantes são embalados pelo toque daquele desejo descontrolado. Parecem loucos… aquele constante subir e descer de olhares – não conseguem manter-se afastados e ao mesmo tempo querem esconder o que sentem.

Quando o metro pára, ela apressa-se a sair. Ele está mais próximo da porta, se bem que temporiza com o ajeitar do casaco para se colar a ela quando passa. Habitualmente apenas sente o aroma dos seus cabelos. Hoje aproveitou a greve geral para meter conversa.

Ela, quase sem voz, respondeu à sua pergunta. Dessa resposta nasceram outras perguntas. A cada pergunta, a cada passo, ela parecia uma miúda perante o primeiro Amor. Ele disfarçava a sua imaturidade através da voz segura, colocada e convicta nas palavras.

No túnel trocaram mais um olhar. Foi um olhar longo e directo. Terminou com um até amanhã, seguido de um sorriso.